Compensação de GEE: tudo o que você precisa saber

compensação de GEE

Desde o final da década de 1990, a prática de compensação de emissões de gases de efeito estufa (ou compensação de GEE) vem ganhando força, chegando ao valor de 63 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente (CO2e) compensadas no ano de 2016, somente pelo mercado de carbono voluntário.

A compensação de emissão é o caminho natural de qualquer empresa ou governo engajado na luta contra o aquecimento global, o principal desafio ambiental da história da humanidade. Assim, as entidades investem inicialmente na gestão de GEE, procurando mitigar as suas emissões da melhor forma possível. A partir daí, as empresas e governos procuram compensar, também, as emissões que não puderam evitar.

A compensação de emissão é baseada no entendimento de que, como a Terra só possui uma atmosfera, não importa onde (geograficamente) se reduza a emissão de GEE, e sim que ela realmente aconteça.

O plantio de árvores e a utilização de créditos de carbono, provenientes do Mercado de Carbono Regulado ou Voluntário, são os dois principais modos de se compensar emissões. Contudo, enquanto o segundo método possui grande base e segurança técnica, o primeiro é alvo de muitas críticas por especialistas.

Vamos compreender melhor os processos relacionados à compensação de emissão e por que essa prática tem de ser tão bem regulamentada? Continue lendo abaixo.

Para garantir a segurança das compensações de emissões de GEE no Brasil, por meio da transparência do processo e de projetos de qualidade, foi criado em 2014 o Programa Amigo do Clima, coordenado pela WayCarbon. Clique aqui e saiba mais sobre o Programa.

Compensação de GEE por plantio de árvores: um risco

Existe no Brasil uma visão equivocada sobre a melhor forma de se compensar emissões de GEE. Muitas pessoas acreditam que a boa prática, nesse sentido, se dá por meio do plantio de árvores, o que não é verdade.

Mas, calma! Plantar árvores está longe de ser algo ruim, pelo contrário! Essa atividade é fundamental para a preservação dos rios, da biodiversidade e do bem estar da população. Contudo, a compensação de emissão pelo plantio de árvores, além de não ser a opção mais barata, não é a melhor alternativa do ponto de vista técnico da questão.

Inicialmente, é importante ressaltar que são necessárias cerca de 5 a 7 árvores nativas em clímax para obter uma tonelada de CO2. E essas árvores levam, em média, 20 anos para chegarem à idade adulta.

Algumas empresas e ONG’s no país oferecem serviços de plantio de árvores para a compensação de emissões de GEE, já considerando as árvores no estado de clímax. Mas a verdade é que, nesse caso, a compensação de emissão só estará realmente finalizada quando as mudas que foram plantadas chegarem à idade adulta. Ou seja, paga-se caro por uma compensação que, no máximo, se tornará efetiva por volta de vinte anos!

Isso é… se tudo der certo! Afinal, muita coisa pode dar errado ao longo do processo: a muda pode não “vingar”, as árvores podem sofrer corte ilegal, sucumbir a uma praga, pode haver um incêndio, etc. E, mesmo se nada der errado, a única certeza que se tem é que um dia a árvore plantada morrerá… de modo natural ou não.

Com esse efeito, não há verdadeiramente uma compensação de emissão pela fixação da biomassa através da fotossíntese, mas sim uma postergação de emissão. Portanto, as árvores plantadas estocam temporariamente uma quantidade de carbono que será emitida posteriormente, quando elas morrerem. Assim, a compensação por plantio de árvores é, no melhor dos melhores casos, uma compensação temporária.

Além disso, a grande maioria dos projetos de plantio de árvores destinados ao mercado de compensação de emissões de GEE não segue uma metodologia de quantificação de carbono internacionalmente reconhecida. Poucos projetos também passam por monitoramento e verificações externas anuais das informações sobre as reais quantidades de CO2e que foram removidas da atmosfera. Ou seja, compra-se créditos de carbono cuja garantia de veracidade da informação é dada exclusivamente pelo próprio vendedor dos créditos. Algo no mínimo muito suspeito, certo?

Ainda nessa linha de alto risco, quase nenhum projeto de plantio possui seu respectivo projeto de carbono registrado em alguma plataforma. Esse fato torna possível que um mesmo crédito de carbono possa ser vendido mais de uma vez, para diversos potenciais clientes.

Como conclusão, é possível resumir que, apesar do imaginário da figura da árvore ser de grande apego popular (quiçá a melhor representação de um mundo sustentável!), a utilização do plantio de árvores para compensação de emissões de GEE é arriscada, temporária e cara.

Os mercados de carbono

Na ECO92, na cidade do Rio de Janeiro, foi criada a Convenção Quadro das Nações Unidas para Mudanças Climáticas (UNFCCC, em sua sigla em inglês) pautada na chamada “responsabilidade histórica”. Dentro desse conceito, todos os países possuíam responsabilidades comuns de mitigar suas emissões, contudo, tais responsabilidades eram diferenciadas. Afinal, existem nações que, historicamente, emitem gases de efeito estufa em grandes quantidades há séculos e outras nações que tiveram seus respectivos picos de desenvolvimento tardiamente.

Dando sequência às Conferências das Partes (COP) – evento em que todos os países da Convenção se reúnem para discutirem as questões climáticas – o Protocolo de Quioto foi assinado em 1997, dividindo os países em:

  1. países com metas de redução dentro do Protocolo (países anexo I)
  2. demais países que não possuíam metas de redução (países não-anexo I).

O Brasil, apesar de grande emissor, ficou no grupo de países sem metas no Protocolo de Quioto, visto ter uma baixa responsabilidade histórica de emissões quando comparado com países que tiveram suas respectivas industrializações séculos antes.

Em outra COP, no ano de 2001, foi assinado o Acordo de Marrakesh, criando os Mecanismos de Flexibilização, entre eles o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MLD). Esse é o único mecanismo entre os quais o Brasil pode participar dentro do mercado de carbono no âmbito do Protocolo de Quioto, o chamado Mercado Regulado. Através dele, projetos de mitigação de emissões de GEE no país podem obter créditos de carbono junto à ONU e esses créditos podem ser vendidos aos países Anexo I.

O Protocolo de Quioto terminou sua ratificação internacional somente em 2005, tornando-se válido em todo o mundo. Centenas de projetos foram desenvolvidos utilizando-se das mais diversas tecnologias de mitigação, como, por exemplo, projetos de energia renovável. Até mesmo projetos de carbono florestais foram desenvolvidos. Contudo, segundo as regras da UNFCCC, tais projetos geram créditos temporários, o que dificulta ou até mesmo inviabiliza a sua comercialização, mesmo que possuam valores de mercado bem inferiores aos créditos de caráter permanente. Por esse motivo, dos 2.873 projetos MDL registrados na UNFCCC até fevereiro de 2016, cerca de apenas uma dezena são projetos florestais.

Créditos de carbono

Cabe ressaltar que, para se obter um crédito de carbono no MDL, que representa uma tonelada de CO2e e é chamado de Redução Certificada de Emissões (CER, em inglês), um projeto de mitigação necessita:

  1. seguir uma metodologia previamente aprovada pela UNFCCC;
  2. Ser validado por uma terceira parte especialista na área/setor (Entidade Operacional Designada – DOE, em inglês);
  3. Obter a aprovação da Comissão Interministerial de Mudança Global do Clima (Autoridade Nacional Designada – DNA, em inglês – constituída no Brasil por 8 ministérios, sendo liderada pelo Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação);
  4. Ser registrado na UNFCCC;
  5. Ser verificado por DOE;
  6. Ter o crédito de carbono emitido pela ONU.

O desenvolvimento de um projeto MDL é, portanto, um longo processo! E esse processo é necessário para assegurar a confiabilidade da redução de emissão. Tais projetos seguem uma metodologia internacionalmente reconhecida, possuem um número de registro e passam por uma verificação externa.

Com a crise do mercado de carbono, a partir de 2012, e os baixos preços dos créditos de carbono MDL, devido principalmente à conjuntura econômica europeia, a UNFCCC passou a aceitar o cancelamento voluntário de créditos.

Assim, tornava-se possível não apenas a utilização dos créditos MDL para alcançar as metas nacionais de redução de emissões dos países Anexo I, mas também para a compensação das emissões de qualquer indivíduo, empresa ou governo. Essa solução da UNFCCC vinha ao encontro da intenção de maximizar os valores dos créditos, já que existia um mercado de comércio de emissão forte e em crescimento fora da ONU, com valores mais atraentes.

Tal mercado não possuía os países como foco, mas principalmente as empresas que gostariam de fazer a sua parte no combate às mudanças climáticas. Como tais empresas não são obrigadas a compensarem as suas emissões, o mercado é chamado de Mercado Voluntário.

Existem diversos tipos de padrões de desenvolvimento de projetos voluntários como, por exemplo, VCS, The Gold Standard, CCX, CAR, ACR, etc. O VCS representou mais de 50% de todo o mercado voluntário em 2016.

Curiosamente, representando cerca de 20% de todos os projetos de carbono no âmbito do mercado voluntário estão os projetos florestais. Contudo, não se tratam de projetos de plantio, mas principalmente de projetos de redução do desmatamento e da degradação (REDD). Nesses projetos há uma reserva técnica de floresta em clímax que não é comercializada, assegurando, portanto, o caráter de crédito permanente, além de também passarem por verificação e registro.

Projetos no mercado voluntário possuem um trâmite similar, mas simplificado quando comparados ao MDL. Há também a necessidade do desenvolvimento do projeto seguindo metodologias internacionalmente reconhecidas, processos de validação e verificação e registro. Contudo, tais projetos não passam por aprovação dos governos nacionais e nem da ONU.

amigo do clima

Amigo do Clima

Como já dissemos acima, o Programa Amigo do Clima é uma iniciativa brasileira que visa a segurança das compensações de emissões de GEE no âmbito nacional. O Programa foi criado em 2014 e é coordenado pela WayCarbon, empresa com 12 anos de experiência na área de sustentabilidade.

Por meio do Amigo do Clima, empresas, projetos, eventos e pessoas podem compensar as suas emissões de gases de efeito estufa. A plataforma do Programa garante a transparência do processo, listando as ações já desenvolvidas, os projetos apoiados e o montante de créditos transacionados.  Além disso, o Amigo do Clima fornece para os seus clientes certificados de compensação de emissões rastreáveis, já que todas as ações possuem um código único e intransferível.

Todas as iniciativas de redução de emissões ligadas ao Amigo do Clima são brasileiras e possuem créditos reconhecidos pela ONU ou pelo VCS.

Conheça o Programa e compense o seu impacto sobre o clima: www.amigodoclima.com.br

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Felipe Bittencourt é engenheiro e historiador, possuindo doutorado em mudança do clima. CEO da WayCarbon, Felipe acredita na tangibilização da sustentabilidade como diferencial competitivo no setor privado. Já sobre o setor público, Felipe gosta de refletir sobre o uso da sustentabilidade como pilar de planejamento estratégico de longo prazo, principalmente para cidades. Felipe gosta de escrever análises técnicas sobre os temas mais atuais na temática de sustentabilidade, com foco no aprofundamento dos conhecimentos dos leitores que já atuam na área.

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  • Fiquei triste ao saber que para você, as árvores não tem todo aquele significado, no entanto, entendo e concordo. Vendo por este lado, a ideia das empresas, principalmente de construção, de plantar árvores é apenas marketing. Maravilhoso seus posts, usarei alguns pontos e claro, com os devidos créditos!

    • Oi Brenna, tudo bem? Obrigado pelos comentários. Olha, eu acho que as árvores são fenomenais e fundamentais para o desenvolvimento sustentável de nosso planeta, bem como para alcançarmos maior qualidade de vida em nossas cidades. Sem dúvida, o desmatamento na Amazônia, no Cerrado e na Mata Atlântica tem que acabar e, ao mesmo tempo, temos que fazer todos os esforços possíveis para reflorestarmos milhares de hectares de nosso Brasil. Contudo, o ponto que abordei é que talvez não seja a melhor alternativa técnica para uma compensação de emissão de GEE o plantio de árvores. Há demasiadamente riscos demais, inclusive de imagem para quem assim o faz. No fundo, ninguém quer ser taxado no final do dia de estar fazendo greenwash. Esperamos mais comentários seus! – Felipe Bittencourt

  • Paulo Eustáquio de Carvalho /

    Se preservar matas nativas em propriedades particulares é ser amigo do clima qual poderia ser uma das maneiras dos beneficiários , ou seja a população compensar , remunerando , os preservacionistas .
    Bolsa Verde do IEF é insuficiente .Falta verba para remunerar a todos .

  • Infelizmente os países ainda seguem o caminho, mais fácil e menos custoso. A verdade é que nenhum chefe de nenhum país esta realmente preucupado ou interessado. O dinheiro e interesses ainda imperam nas vontades deles. As vezes imagino eu que quando nosso planeta não tiver mais como se recuperar eles (nossos governantes) estarão em marcha indo para onde ? Lua, Marte ?
    A melhor saída mesmo é focar na população mundial, um a um, cada qual com sua responsabilidade.

  • Carlos Alberto Pereira da Costa /

    Atualmente, um imóvel de 4 milhões de metros quadrados coberta com vegetação nativa da mata Atlântica no município de Itanhaem tem condições de vender créditos de carbono desta cobertura vegetal?
    Alguma forma de se remunerar?

    • Sim, Carlos! é possível descrever um projeto técnico e obter remuneração pela preservação dessa área!

      • Felipe Bittencourt /

        Oi Carlos e Bianca, tudo bem? Muita coisa se passou desde que eu escrevi esse post. Florestas ganharam uma outra envergadura e projetos do tipo REDD – Redução das Emissões do Desmatamento ou Degradação ganharam projeção, subiram de valores etc. Contudo, tenho que discordar da Bianca. 4 milhões de m2 são 400 ha. Para projetos de carbono é uma área ainda pequena. Os custos de transação de um projeto REDD são elevados e não justificaria um projeto hoje. Mesmo rodando números de um projeto redd planned deforestation, cujos valores de venda são bem mais baixos, não se justifica. Ainda. Quem sabe no futuro.

  • A vegetação tem outros papéis além da questão do CO2. Ela é fundamental em serviços ambientais, como conforto térmico, ciclo hidrológico, contenção de erosão, etc. Par a questão de absorção do CO2, é viável associar áreas de vegetação nativa já em clímax com plantios de vegetação para corte destinada a algum uso industrial (Pinus, Acácia, etc) de forma que sempre vai ter corte e reflorestamento e, assim, absorção de carbono.

  • Parabéns pelo artigo Felipe, tema necessário e com pontos esclarecedores.
    É importante ter clareza sobre os mecanismos de compensação já que nosso objetivo é promover a mudança na forma de trabalhar, visando a baixa emissão de Co2.
    Como está o cenário brasileiro para um mercado de carbono regulado?

  • Renata Serapião /

    Obrigada pelas informações, você sabe me dizer se existe custo para manter a custódia de um crédito de carbono?

  • Parabéns pelo artigo Felipe! Uma dúvida,

    Por favor, considerando nossa realidade atual, qual seria a dimensão mínima de uma área com vegetação nativa que compensasse os custos envolvidos a fim de obter remuneração sob a área preservada?

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