Entrevista: WayCarbon e ICC apoiam governo na regulamentação do mercado de carbono

O Senado aprovou no dia 4 de outubro o projeto de lei (PL) 412/2022, que foca na regulamentação o mercado de carbono no Brasil. De acordo com o PL 412/2022, ficam sujeitas ao Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) empresas e pessoas físicas que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e) por ano, com exceção para o agronegócio. Como próximos passos, a matéria irá passar pela Câmara, a menos que haja pedido para votação no Plenário. 

Nesse contexto, a ICC Brasil e a WayCarbon trabalharão em conjunto com o Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) no desenvolvimento de recomendações para o desenho do Sistema de MRV do mercado regulado nacional. As organizações também atuarão nos processos e critérios envolvidos no relacionamento entre o mercado regulado e o mercado voluntário. O projeto é financiado pelo UK PACT (Partnering for Accelerated Climate Transitions), iniciativa do Reino Unido de combate às alterações climáticas.  

MRV é a sigla para Mensuração/Monitoramento, Relato e Verificação, etapas fundamentais para a execução de qualquer planejamento climático. Seu principal objetivo é o gerenciamento de resultados e impactos das ações de resposta às mudanças do clima. Além disso, a metodologia também pode ser usada para a tomada de decisão quanto a investimentos, o processo de geração de créditos de carbono e o estabelecimento de metas e métricas. 

Bruna Araújo, Gerente de Finanças Sustentáveis, e Letícia Gavioli, Consultora Sênior, da WayCarbon, foram entrevistadas pelo blog sobre o projeto, a regulamentação do mercado de carbono no Brasil e a importância da parceria entre setor público e privado no combate às mudanças climáticas.  

1.Qual é o objetivo do projeto? Como ele apoia a regulamentação do mercado de carbono no Brasil?

Apoiar o Governo Federal na integração do mercado voluntário de carbono ao futuro mercado regulado de carbono brasileiro. Para isso, vamos analisar experiências internacionais de mercados regulados e de programas de registro de projetos de carbono, apresentando recomendações para o credenciamento de programas de registro (standards) para aceitação de offsets¹ no Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões (SBCE) e para a integração dos registros desses offsets ao Registro Central a ser criado no âmbito do SBCE. 

2. Quais são as fases envolvidas? 

O projeto está organizado em cinco grandes atividades, que envolvem a produção de documentos técnicos de suporte à tomada de decisão do Governo e a realização de atividades de engajamento, de treinamento e de disseminação de conhecimento para agentes do governo e do mercado em temas relevantes da regulamentação do mercado de carbono no Brasil. Vamos trazer recomendações para o credenciamento de programas de registro (standards) para aceitação de offsets no SBCE apoiados em um benchmark dos programas de registro internacionais disponíveis, como Verra, Gold Standard e ART Trees. O objetivo é avaliar escopos setoriais elegíveis e mais aderentes à realidade brasileira; critérios de qualidade desses projetos de carbono, incluindo um olhar sobre igualdade de gênero e inclusão social a ser incorporado no mercado brasileiro. 

Na sequência, trabalharemos com a integração dos registros dos offsets ao Registro Central a ser criado no âmbito do SBCE. Para tanto, realizaremos atividades de identificação de sinergias com outros projetos em desenvolvimento/implementação relacionados ao funcionamento do Registro Central a ser criado no âmbito do SBCE; e de avalição comparativa da forma de integração dos registros dos offsets aos Registro Centrais, envolvendo o mercado regulado de jurisdições onde tal sistema já foi implementado. Espera-se, com isso, identificar os principais elementos e características para a integração dos registros dos offsets ao mercado regulado no Brasil.  

Os outros três grandes produtos do projeto são destinados à capacitação sobre o tema e ao engajamento com o governo, setor privado e organizações da sociedade civil disseminando o conteúdo produzido no âmbito do projeto.   

3.De que forma a metodologia MRV será usada no projeto? 

O Monitoramento, Relato e Verificação no âmbito do SBCE deverá ocorrer por meio do Registro Central do sistema. A consolidação das informações sobre emissões e remoções de gases de efeito estufa será feita nesse Registro Central, incluindo também todas as transações relacionadas ao SBCE, bem como transferências internacionais de resultados de mitigação, e a contabilização dos resultados para o atingimento das metas da Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC) do Brasil. O projeto trará recomendações para a integração dos registros dos offsets ao Registro Central, uma vez que tais ativos somente serão reconhecidos no âmbito do SBCE por meio de sua inscrição no Registro Central.   

4.Como o mercado regulado e o mercado voluntário podem se relacionar? 

Créditos de carbono provenientes do mercado voluntário podem ser utilizados como um mecanismo de flexibilidade (offsets) do mercado regulado, fornecendo opções adicionais de custo de abatimento potencialmente mais baixo para as entidades reguladas e, ao mesmo tempo, incentivando atividades de mitigação em outros setores não regulados. Em geral, com alguma limitação, tanto de quantidade, como de escopo setorial de projetos, offsets podem ser utilizados para cumprir parte das obrigações de entidades reguladas no mercado regulado, reduzindo os custos de conformidade do sistema.  

5.Qual é a importância da parceria entre os setores público e privado no combate às mudanças climáticas? 

Em um contexto de emergência climática, todos os esforços são necessários, independentemente se provenientes de atores do setor público ou privado. Para além de compromissos voluntários do setor privado e de ações de mitigação de emissões de responsabilidade exclusiva do setor público, é crucial que a política pública direcione o setor privado para que as suas ações de mitigação apoiem o país no atingimento de obrigações climáticas, dispondo de mecanismos custos-efetivos para tal, como é o caso do mercado de carbono regulado. Tais mecanismos proporcionam um menor custo de conformidade, em comparação a mecanismos de comando e controle, uma vez que permitem que as metas de setores/entidades mais carbono intensivos e com maiores custos de abatimento sejam atingidos com o auxílio de resultados de mitigação de setores/entidades com menores custos de abatimento por meio das transações dos mercados de carbono.  

¹ Offsetting é a compensação das emissões residuais de uma empresa ou de um produto por meio da compra de créditos de carbono nos mercados, regulados e voluntários, como o Clean Development Mechanism (CDM), Verified Carbon Standard (VCS) e Gold Standard (GS). 

Maria Luiza Gonçalves
Jornalista e Analista de Comunicação at WayCarbon | + posts
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