Desafios para a descarbonização do setor de saneamento

O setor de saneamento desempenha um papel de extrema relevância para o desenvolvimento socioeconômico, com implicações significativas no âmbito social, particularmente para populações de baixa renda, na saúde pública, pelo controle de vetores e doenças de veiculação hídrica, e pela gestão de um recurso econômico fundamental: a água. Além disso, a preservação dos recursos hídricos e a prevenção da poluição dos ecossistemas aquáticos contribuem para a manutenção da biodiversidade e dos recursos naturais no longo prazo.

No Brasil, quase 100 milhões de habitantes (44,2% da população) não possuíam acesso à coleta de esgoto em 2021. No mesmo ano, apenas 51,2% do esgoto produzido foi tratado. Portanto, a universalização do acesso ao saneamento é um desafio central de desenvolvimento nacional. Neste contexto, a aprovação do Marco Legal do Saneamento Básico (Lei n° 14.026) que objetiva a ampliação da abrangência de coleta e tratamento de esgoto para 90% da população até o fim de 2033, lança alguns desafios.

Em primeiro lugar, o déficit histórico de infraestrutura deverá ser rapidamente transformado em um curto espaço de tempo, demandando investimentos e capacidade de implementação. Em segundo lugar, a ampliação das redes de saneamento e dos sistemas de tratamento de água e esgoto devem ser acompanhadas por iniciativas de otimização e redução de perdas. Dados de 2020 apontam que as perdas físicas corresponderam ao consumo de 66 milhões de brasileiros em um ano.

Em terceiro lugar, a mudança do clima confronta o setor com extremos de precipitação e secas e com alterações dos padrões de pluviosidade, ampliando os riscos operacionais e afetando ativos das redes, como tubulações e sistemas de elevação. Qualquer plano de investimento deve, obrigatoriamente, incorporar os riscos presente e futuro da mudança do clima.

Por fim, a amplitude de alternativas tecnológicas demanda a otimização dos custos de capital, dos custos operacionais e das emissões de gases de efeito estufa (GEE) particularmente em estações de tratamento de esgoto. No Brasil, as emissões por tratamento de efluentes totalizaram 31 Mt CO2e em 2021, o correspondente à 1,3% das emissões nacionais. A ampliação dos sistemas de tratamento cria, portanto, uma oportunidade de implementar tecnologias de baixa emissão.

Saneamento e Emissões de GEE

Sistemas de tratamento de efluentes emitem gases de efeito estufa por diferentes motivos. O maior volume de emissões está associado a sistemas de tratamento anaeróbios, uma vez que a decomposição de matéria orgânica em ambientes com baixa concentração de oxigênio (metanogênese) produz metano (CH4), um gás com potencial de aquecimento global 28 vezes maior que o CO2. Exemplos de sistemas são lagoas e reatores anaeróbios.

No Brasil, devido a disponibilidade de área, menor custo de operação e suficiente eficiência, sistemas de lagoas de estabilização e de reatores anaeróbios são amplamente utilizados tanto para tratamento de efluentes domésticos quanto de efluentes industriais. Por sua vez, tecnologias aeróbias como sistemas de lodos ativados, a depender das condições de operação, da configuração do sistema e controle do processo, podem produzir quantidades significativas de matéria orgânica (“lodo”) que pode ser fonte adicional de metano dependendo do tratamento e destinação final deste subproduto.

Sistemas aeróbios, desde que bem operados, emitem muito pouco metano em possíveis focos anaeróbios formados na turbulência do processo ou na tubulação a montante, e têm como principal fonte emissora de gases de efeito estufa a eletricidade consumida pelos aeradores e a digestão do lodo se realizada em meio anaeróbio sem captura e queima do metano gerado. Estes sistemas costumam ser adotados em situações de restrição de área de implantação, por serem mais compactos que sistemas de lagoas, por exemplo, ou em situações que exigem tecnologias de controle ambiental específicas.

Oportunidades de Descarbonização

De maneira ampla existem duas rotas de descarbonização para o setor de saneamento. (i) Tecnologias ou medidas que evitam a produção de metano e (ii) tecnologias que capturam e destroem ou utilizam o metano.

Medidas para evitar a produção de metano incluem ações de melhoria operacional em sistemas de tratamento, como garantir o correto funcionamento de sistemas de aeração ou a remoção eficiente da carga orgânica do afluente nos sistemas de tratamento primário, ou a adoção de tecnologias que não emitem metano.

Por outro lado, medidas para captura e utilização de metano tem elevado potencial no Brasil dado o potencial de utilização de sistemas anaeróbios no país. Estas tecnologias permitem a coleta e destruição do metano.

Como esforço mínimo, todos os sistemas anaeróbios deveriam adotar sistemas de captura e queima do biogás em flare (sistemas de queima), contudo, a grande oportunidade de descarbonização encontra-se na coleta, tratamento, armazenamento e utilização do biogás como combustível. Neste caso, a redução de emissão acontece na destruição do metano e no uso do biogás quando este substitui uma fonte fóssil de energia.

Cenários, transição e investimentos

Dado o potencial do setor de reduzir suas emissões faz-se necessário a implementação de projetos de mitigação de emissões e mudanças tecnológicas para evitar o aumento das emissões de gases de efeito estufa e maximizar as oportunidades de descarbonização tanto do próprio setor quanto da economia brasileira pela ampliação da utilização do biogás.

Frente a esse contexto, a WayCarbon desenvolveu uma abordagem estratégica e abrangente como resposta aos desafios complexos da transição para uma economia de baixo carbono, considerando as particularidades da operação de concessões do setor, tendência de expansão e demanda de investimentos de descarbonização.

A solução abrange o desenho de cenários futuros de emissões, a avaliação e priorização de alternativas de descarbonização custo-efetivas, identificação de instrumentos de financiamento, bem como o estabelecimento de mecanismos internos de precificação de carbono para direcionar a tomada de decisão no sentido dos objetivos climáticos traçados. 

Entre em contato com nossos especialistas e entenda como podemos apoiar os desafios de sua empresa na jornada de descarbonização.

Referências

Instituto Trata Brasil: ttps://tratabrasil.org.br/principais-estatisticas/esgoto/

Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS 2021 (https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/saneamento/snis)

Marco Legal do Saneamento: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2020/lei/l14026.htm

ATLAS Esgotos – Estações de Tratamento de Esgoto (2019), Agencia Nacional de Águas – ANA: https://metadados.snirh.gov.br/geonetwork/srv/api/records/1d8cea87-3d7b-49ff-86b8-966d96c9eb01/attachments/ATLAS_Esgotos_Tabela_ETEs_2019.xlsx

 

 

Julia Rymer
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Felipe Tassi
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