Como os municípios devem se preparar para eventos climáticos extremos?

A maior catástrofe climática da história no Rio Grande do Sul tem sido devastadora e, infelizmente, não deve ser a última para territórios no Brasil e no mundo. De acordo com a Defesa Civil do estado, até o dia 26 de maio, mais de 2,3 milhões de pessoas, em 469 municípios, foram afetadas. Já são mais de 530 mil cidadãos desalojados e 169 óbitos registrados. Diante desses acontecimentos, a WayCarbon se solidariza com todos os afetados e se coloca à disposição de governos e empresas para orientações técnicas.

Estudos revelados pela ciência são claros: os eventos climáticos extremos não podem ser mais negligenciados por governos empresas e pela sociedade em geral. Mas, afinal, quais soluções podemos propor para evitar que o cenário dessa tragédia se repita?

Soluções para lidar com eventos climáticos extremos

Como primeiro passo, necessitamos de um bom diagnóstico de cada município ou região geográfica, para identificar os locais mais expostos aos riscos climáticos, a partir da combinação de elementos sociais, ambientais e de infraestruturas existentes. A partir da identificação das áreas de riscos, um plano de adaptação climática deve ser elaborado, implementado e monitorado sob responsabilidade dos governos locais. O documento também precisa contar com o envolvimento e ser comunicado com todas as partes interessadas. Para cada cidade, há um plano específico e a criação instrumentos técnicos que gerem insumos para alocação de recursos; bem como a formulação de legislações e políticas públicas são essenciais para apoiar a execução das ações de adaptação.

Dentre um conjunto de ações que podem reduzir os impactos sociais, econômicos e perdas da biodiversidade, originados por eventos climáticos extremos, alertamos gestores públicos para algumas ações que podem ser de tecnologia, sociais ou baseadas na natureza: a necessidade de análise da ocupação habitacional próximas ou em áreas de risco, revisão dos planos diretores; revitalização de áreas verdes, criação de corredores verdes urbanos; gestão eficaz de multibacias hidrográficas; infraestruturas de drenagens, que garantam proteção do contra inundações e que considerem dados climáticos futuros; sistemas de alerta eficientes, além de ações de educação e sensibilização ao tema da emergência climática que estamos vivendo, entre outras iniciativas.

Os alertas da ciência

O Sexto Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), lançado em 2022, já alertava para um grande volume de precipitação projetada para a região Sul do país no curto, médio e longo prazo. No caso do evento extremos de maio, as causas apontadas foram: a intensificação do aquecimento global devido a ações antrópicas e reforçada por variabilidades naturais na dinâmica atmosférica, como o fenômeno El Niño e outros de oscilação decadal, além de eventos meteorológicos que ocorreram na região e em outras partes do Brasil, como a Alta Pressão que funcionou como um bloqueio para o deslocamento da frente fria.

Dados de alguns dos modelos climáticos disponibilizados pelo IPCC e trabalhados estatisticamente pela WayCarbon mostram um aumento significativo das precipitações intensas no Rio Grande do Sul nos próximos anos, quando comparados a 1941, ano em que a capital Porto Alegre sofreu sua maior enchente até então. Ao analisar a variável de maior volume e concentração de chuva em um (1) dia (conhecida como RX1day), que traduz a intensidade e magnitude do evento, a projeção para Porto Alegre em 2025 já é 20% maior do que as chuvas estimadas pelos modelos em 1941, chegando a 60% até 2050.

Portanto, o que vimos no evento recente, foram chuvas já bem acima da média esperadas para o mês e em alguns municípios, superando o que era esperado para três meses. Além disso, todos os modelos convergem para um aumento da precipitação intensa nos próximos anos, chegando à probabilidade de um incremento de 50 a 80% em grande parte do estado, o que nos leva a inferir que eventos como o de maio de 2024 podem acontecer novamente. Ainda que a incerteza seja inerente aos modelos climáticos, de modo geral, vale reforçar a importância de se trabalhar com dados projetados a partir da visão de possíveis cenários de aquecimento adicional, como uma ferramenta de gestão.

 

Fonte: Análise estatística aplicada pela WayCarbon a partir dos dados disponibilizados no CMIP6 – Cenário SSP3-7.0 – RX1day = Maior precipitação acumulada em 1 dia.

Somados ao grande volume de precipitação projetado, a suscetibilidade do ambiente natural, considerando as características do relevo e da hidrografia do estado, associados a forma de ocupação urbana das cidades, reforçam a urgência para que as políticas públicas sejam pensadas para serem eficazes em ações de preparo, na gestão proativa dos riscos. E isso vale não apenas para o Rio Grande do Sul, mas também para todo o território brasileiro.  

Uma vez que todas as regiões do Brasil podem ser afetadas por diferentes eventos climáticos e em variadas magnitudes, torna-se mais do que necessário que haja uma destinação correta dos recursos financeiros, não só nos pós desastre, mas também em ações de adaptação que visam a redução dos riscos ao máximo e que garantam a segurança da população e do ecossistema e a integridade das infraestruturas críticas. Nesse sentido, devemos usar a ciência a serviço do problema; e parcerias público-privadas são fundamentais, seja para a construção de obras de infraestrutura ou educação e sensibilização ao tema da emergência climática. 

Melina Amoni
Gerente de Risco e Adaptação at WayCarbon | + posts
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